Edmilson Volpi*
Em artigo para o Geografia Infinita, o filólogo espanhol Bernardo Ríos, nota que, quando se viaja para Portugal, dependendo do lugar que se visita e aguçando um pouco mais os sentidos, percebe-se duas grandes obsessões da ideologia nacional cultivada cuidadosamente tanto pelas instituições oficiais portuguesas quanto pela população.
A primeira, o mar, compreensível dada a sua localização geográfica. A outra, a época das grandes explorações, também compreensível dada sua história e, mais uma vez, consequência da sua localização geográfica.
A partir daí, Ríos traça a história da construção do vasto império português, que englobou os cinco continentes e remonta à “entidade política portuguesa”, iniciada no século XI como um dos primeiros países do mundo.
O Condado Portucalense
Entre os anos de 1087 e 1091, o cavaleiro francês Henrique de Borgonha chegou ao Reino de León (atual Espanha) para ajudar na luta contra os muçulmanos. Casou-se com Teresa de León, filha do rei Afonso VI, e recebeu o Condado Portucalense.
Este não deve ser confundido com outro Condado Portucalense fundado no século IX e bem menor. Quando Henrique morreu, Teresa governou o condado até que seu filho, D. Afonso Henriques, atingisse a maioridade.
Ela começou a se autodenominar rainha, mas foi seu filho, depois de derrotá-la no campo de batalha, que viu sua reivindicação reconhecida e pôde se intitular rei de Portugal.
O condado Portucalense original partilhava a fronteira norte e leste do Portugal atual e, ao sul, estendia-se até Coimbra, no centro do país.
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A primeira expansão do reino de Portugal
D. Afonso Henriques, chamado o conquistador, deixou como legado um reino com o dobro do tamanho que havia recebido (veja imagem do alto da página).
Em 1249, foi concluída a Reconquista portuguesa, com a expansão para o extremo sul, a chegada ao Algarve e a expulsão dos mouros, definindo as fronteiras do país praticamente aos limites que se conhecem até hoje.
Em 1415, Ceuta, no Marrocos, foi conquistada, marcando o início de expansão do império português. Decidiu-se explorar a costa africana, ao sul e, em menor escala, a oeste.
Em 1418/19, Portugal chega à ilha da Madeira e, em 1427, ao arquipélago dos Açores, no meio do Oceano Atlântico, a meio caminho da América do Norte [em verdade, as duas ilhas mais a oeste do arquipélago (Corvo e Flores) encontram-se já sobre a placa tectônica norte-americana, embora sejam território europeu].
Em 1471, um posto comercial foi estabelecido no Golfo da Guiné, na costa africana. O objetivo era chegar às Índias para dominar o comércio de especiarias. Em 1488, os portugueses cruzaram o Cabo da Boa Esperança, na África do Sul.
A primeira etapa do império português
Após a chegada de Colombo à América e a divisão do mundo entre Portugal e Espanha pelo Tratado de Tordesilhas, a Índia foi alcançada em 1498 e o Brasil, em 1500.
Em 1510, foi fundado o Estado Português da Índia, com capital em Goa. Em 1511, Malaca foi fundada e as Molucas, as apreciadas ilhas das especiarias, foram alcançadas. Macau foi fundada em 1557 e Nagasaki, no Japão, em 1570.
De longe, a parte mais importante do império português era o Brasil. De 1500 a 1530, a presença portuguesa parece ter se limitado a expedições de coleta de pau-brasil, árvore da qual era feira uma tintura de boa qualidade.
A colonização começou, de fato, em 1534, quando D. João III organizou o território em 12 capitanias hereditárias. Mais tarde, em 1549, o modelo mudou e foi incorporado um governador geral para toda a colônia.
As outras duas principais colônias de Portugal, que manteve até o final do século XX, foram Angola e Moçambique na costa africana.
Uma boa data para estudar a colonização de Angola é 1575, quando a atual capital, Luanda, foi fundada com o objetivo de dominar o comércio de escravos.
Quanto a Moçambique, o controle da área já era efetivo em 1530, embora a ameaça dos corsários turcos fosse constante.
Após a independência da Espanha
Após a independência da Monarquia Espanhola, em 1640, Portugal viveu guerras contínuas com a Holanda e com a Espanha. Com a primeira, por manter seu império colonial, com a segunda, por sua independência.
A última e definitiva paz com a Holanda foi selada com a recuperação dos territórios que ela havia tomado no Brasil, mas também com a perda de muitos lugares asiáticos.
As primeiras perdas ocorreram cedo, já no século XVII, para a Inglaterra, na Índia, e as já mencionadas contra a Holanda.
Ao longo do século XVIII, os conflitos com a Espanha na América foram constantes e, no início do século XIX, foi fundado o Reino Unido do Brasil, Portugal e Algarve.
Este estado transformou Portugal em uma província, embora não do Brasil, mas de um país cuja capital era o Rio de Janeiro e cujo território mais importante era o sul americano.
A independência das colônias
Portugal teve que reconhecer a independência do Brasil em 1825. Após essa enorme perda, o país se concentrou em expandir seus territórios em Angola e Moçambique.
Em 1961, a Índia invadiu militarmente Goa e o resto dos enclaves do subcontinente. Em 1975, ocorreu a Revolução dos Cravos, pondo fim à ditadura de Salazar. O novo governo republicano rapidamente concordou em reconhecer a independência dos dois países africanos e do Timor Leste, o arquipélago indonésio.
O ultimo enclave colonial português foi a atual cidade chinesa de Macau, entregue ao gigante asiático em 20 de dezembro de 1999.
Para Ríos, que considera Portugal “uma autêntica jóia e uma maravilha”, o país tem a fama de ser a terra da tristeza, das vozes melancólicas do fado agitando as roupas penduradas nas janelas, dos intrépidos marinheiros que navegavam pelos mares de todo o globo, de Eça de Queirós, José Saramago e do enorme, insubstituível e inimitável Fernando Pessoa.
Mas, sobretudo, segundo Ríos, “Portugal vive com a cabeça voltada para a nostalgia ou, melhor, para a saudade de um passado pesado demais para umas costas tão pequenas”.
Leia o artigo original aqui e a tradução, no Curiosidades Cartográficas.
* Edmilson M. Volpi é engenheiro cartógrafo e editor da página Curiosidades Cartográficas no Facebook e Instagram