Luiz Ugeda*
O Brasil é onde se envelhece mais rápido no mundo e ocorre sob condições de pobreza, já dizia em 2020 o presidente do Centro de Longevidade Brasil, Alexandre Kalache. Segundo informações da Organização Mundial da Saúde (OMS), também de 2020, a França levou 145 anos para dobrar a população de idosos – em 1850, eram 10%, já em 1995, passou a ser de 20%. No Brasil, isso vai acontecer em apenas 25 anos – de 10% em 2010, para 20% em 2035. Mas talvez ocorra em tempo menor.
De acordo com as Projeções de População 2024, divulgadas pela Fundação IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nesta quinta-feira (22/8), que pela primeira vez utilizam os dados do Censo de 2022, o crescimento populacional, que impulsionou a força de trabalho e o desenvolvimento econômico por décadas, realmente está chegando ao fim.
Se em 2000 o Brasil contava com 3,6 milhões de nascimentos anuais, em 2022 esse número caiu para 2,6 milhões e deve seguir diminuindo até 2070, quando apenas 1,5 milhão de crianças nascerão por ano. Em 2042, a população brasileira começará a diminuir, podendo ocorrer em um prazo menor. Essa mudança demográfica coloca o país em uma posição delicada, principalmente por estar a ocorrer em uma importante lacuna estatística.
O último Censo Demográfico apontou 203.062.512 habitantes no Brasil. Entretanto, o IBGE estima que a população brasileira em 2023 era de 210,8 milhões de pessoas, uma diferença de quase 8 milhões de pessoas, o equivalente as populações de todos os países bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia). Para a Fundação IBGE, essa diferença é resultado de fatores como subnotificação e inconsistências que podem ter afetado o trabalho censitário do ano anterior, como falta de pessoas para responder aos recenseadores nas casas visitadas.
Uma pessoa leiga em estatística poderia perguntar que, se institutos de pesquisas eleitorais, de forma amostral, dão em torno de 2% de margem de erro, por que a Fundação IBGE tem o privilégio de se autorretificar em mais de 4% tendo a obrigação legal de contabilizar toda a população do país? Ainda precisamos ir a casa de todo mundo se diversos órgãos estatísticos internacionais usam a internet para fazer o censo? Não existe uma via híbrida onde, p. ex., podemos coletar dados online das populações com acesso a internet para diminuir esta lacuna de 8 milhões de pessoas? Por que os métodos de coleta de dados da Fundação IBGE não entraram na disrupção do século 21?
O otimismo de que o futuro traria prosperidade foi substituído pela urgência de repensar o modelo de desenvolvimento no geral e a coleta de dados do país em específico. O desafio agora é como lidar com uma população em declínio e em envelhecimento, em um contexto em que as oportunidades de crescimento econômico estão se tornando mais limitadas, boa parte das pessoas em idade produtiva estão indo embora, nossa governança estatística e geográfica carece de uma profunda transformação e a África, que neste momento tem seis capitais nacionais em construção, está em plena ebulição demográfica e deverá atrair investimentos de forma mais fácil do que a América Latina nas próximas décadas.
Os próximos anos exigirão ação imediata para que o país possa, ao menos, encontrar novos caminhos para garantir o bem-estar de sua população mais velha e fazer um “pouso demográfico” menos abrupto. Devemos ao menos permitir que estas gerações, que acreditaram que o Brasil seria o país do futuro, cumpram sua trajetória com dignidade.
*Advogado e geógrafo, pós-doutor em Direito e doutor em Geografia. Autor do livro Direito Administrativo Geográfico. Fundador e CEO da Geocracia Legaltech.