
Censo 2022: Olinto critica judicialização para incluir pergunta de gênero

O ex-presidente do IBGE, Roberto Olinto, criticou a decisão da Justiça Federal que mandou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) incluir campos sobre orientação sexual e identidade de gênero no Censo 2022. A decisão liminar, que atendeu pedido do Ministério Público Federal (MPF), deu 30 dias ao IBGE para explicar como vai adequar os questionários do censo, que começa já no dia 1º de agosto.
Falando ao Geocracia, Olinto criticou a interferência do judiciário em uma questão que, segundo ele, é puramente técnica e de exclusiva responsabilidade do IBGE: “Em nenhum lugar do mundo se faz estatísticas com medidas de força, medidas judiciais. A responsabilidade é do instituto de estatística. Da mesma forma que o instituto de estatística não processa ninguém, porque não é sua função”, disse o ex-dirigente.
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O MPF argumenta que a falta de estatísticas dificulta o desenvolvimento de políticas públicas voltadas para a população LGBTQIA+, mas Olinto afirma que, assim como diversos órgãos de estatística no mundo, o IBGE está trabalhando para descobrir a melhor maneira de pesquisar essa questão, e que o Censo não é a pesquisa certa para esse tipo de pergunta.
“Como é que você vai perguntar a um chefe de domicílio (que é quem responde o questionário) de uma área pobre do interior do Brasil se existe alguém LGBTQIA+ na casa? Será que ele sabe responder? Além disso, existe a questão da privacidade. Essa pessoa tem a informação precisa para comunicar a orientação sexual dos demais moradores do domicílio?”, questiona Olinto, temendo pela qualidade da pesquisa e acrescentando que esse tipo de pergunta precisa ter resposta individual, sigilosa: “Você entrega um tablet para a pessoa e ela responde. O pesquisador nem fica sabendo da resposta”.
Olinto cita, inclusive a Pesquisa Escolar do IBGE, que tem questões delicadas e é feita dessa maneira: “O aluno recebe um tablet e, sozinho, responde as perguntas, por exemplo, se consome drogas. Você não vai perguntar para um aluno de escola ‘Você usa drogas?’ Não é assim. Você entrega um tablet e ele tem privacidade para responder”.
IBGE recorre da decisão
A mesma opinião tem o IBGE que, nesta segunda-feira (06), anunciou que está recorrendo da decisão da Justiça. “A metodologia de captação das informações do censo permite que um morador possa responder por ele e pelos demais residentes do domicílio. Pelo caráter sensível e privado da informação, as perguntas sobre a orientação sexual de um determinado morador só podem ser respondidas por ele mesmo”, afirma o Instituto em nota.
Roberto Olinto salienta ainda que a agenda estatística de um país é definida pelo IBGE, que é o coordenador do tema e tem autonomia para tal. “O questionário do Censo 2022 foi construído ao longo de quatro a cinco anos, em consultas a vários interessados, sociedade civil, academia, grupos específicos, como quilombolas, avaliando a viabilidade de se colocar determinados levantamentos em um censo demográfico”, diz Olinto, que considera que qualquer interferência gera dados mal feitos.
Pelos mesmos motivos, ele critica a inclusão da pergunta sobre autismo no Censo 2022, outra interferência, dessa vez do presidente Jair Bolsonaro: “A pergunta será feita e o resultado será ruim. Porque, equivalente à questão de gênero, são respostas pelo chefe do domicílio que não serão confiáveis, porque as pessoas não sabem se o filho tem ou não autismo. É responsabilidade do Ministério da Saúde registrar os diagnósticos de autismo”.
Com informações da Folha de S. Paulo