O IBGE divulgou nesta terça-feira (30) o primeiro balanço do Censo 2022, iniciado em 1º de agosto. Até agora, a pesquisa, fundamental para um raio-X preciso do país e para a elaboração de políticas publicas, já contou 59.616.994 brasileiros, sendo 31 milhões de mulheres (52%) e 28,4 milhões de homens (48%). O prazo para concluir a coleta em 31 de outubro está mantido.
Os números foram comemorados pelo IBGE em uma entrevista coletiva, mas problemas com pagamentos a recenseadores, uma inédita ameaça de greve da categoria durante o Censo e casos de recusa de moradores em receber a pesquisa até de forma violenta foram foco de atenção durante o encontro.
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Os perfis do IBGE nas redes sociais dão bem a ideia do que está acontecendo, com diversos recenseadores reclamando da falta de pagamento nos comentários dos posts do IBGE no Instagram e no Facebook. Uma greve da categoria, algo jamais visto, está marcada para dia 1º de setembro e os responsáveis por aplicar os questionários do Censo ameaçam desligar os DMC (dispositivos móveis de coleta) durante um dia inteiro.
“Isso que o IBGE está fazendo com os recenseadores não tem nem nome. O dinheiro do treinamento esquecido, ajuda de custo nem se viu. Entreguei hoje os materiais. Boa sorte aos que ficam”, comentou uma recenseadora no Instagram, recebendo diversos outros comentários na mesma linha. Postagens como essas são muitas e vêm de todo o país.
O coordenador de Recursos Humanos do IBGE, Bruno Malheiros, admite que problemas com pagamentos de recenseadores aconteceram, sobretudo em relação a auxílio treinamento e locomoção. Ele reconhece que muitas pessoas tinham uma expectativa menor sobre os prazos de pagamento: “Talvez não tenha ficado claro para os recenseadores, nos treinamentos, o processo de pagamento”.
Os pagamentos contam cinco dias úteis, mas só a partir da supervisão dos dados entregues pelo recenseador, que pode levar até 10 dias corridos. O IBGE, no entanto, anunciou que, a partir desta terça-feira, vai avalia agilizar esse prazo.
Bruno disse ainda que o IBGE não tem informações sobre a greve, tem trabalhado muito para resolver os problemas de pagamentos e que, hoje, esses casos não são generalizados: “Não contamos com essa paralização”.
Há ainda muita reclamação sobre casos de agressão e assédio a recenseadores, além das esperadas recusas de moradores (sobretudo em condomínios) em receber o Censo: “Um homem quase me bateu quando perguntei o sexo dele; já saiu gritando comigo e me perguntando que tipo de pergunta é essa, porque ele é muito macho”, desabafou uma recenseadora em um grupo, conforme relata o jornal Cruzeiro do Sul, de Sorocaba. Outro reclamou que um morador ameaçou soltar os cachorros ao ser procurado para responder o Censo.
Em relação à recusa, o IBGE diz que, até agora, a taxa de recusa é de 2,3%, o que estaria dentro das expectativas e é menor do que a recusa da PNAD contínua, de 3%. Mas, em 2010, recusas e domicílios ausentes somaram 2%. O IBGE afirma que vai trabalhar para zerar as recusas e que tem experiência para fazer isso.
Preocupação com a qualidade dos resultados do Censo
Esse tipo de situação já era esperado, mas, segundo quem conhece a mecânica do Censo, o IBGE teria divulgado pouco a pesquisa, este ano, e treinou mal o pessoal que teria de enfrentar o problema: “Tirando os casos patológicos, essa má receptividade a recenseadores é falta de comunicação”, afirma Roberto Olinto, ex-presidente do IBGE. “Não investiram em publicidade e divulgação, o que era especialmente importante em uma situação atípica de censo em ano eleitoral e com a sociedade tão polarizada. Não fizeram ações tradicionais de outros Censos, como levar faixas a jogos de futebol televisionados ou agendar aparições em novelas, por exemplo. Esse trabalho é chave no Censo”.
Coordenador de Contas Nacionais do IBGE de 1995 a 2014, diretor de Pesquisas do Instituto de 2014 a 2017 e presidente do órgão entre 2017 e 2019, Olinto se diz preocupado com as reclamações que, no seu entender, mesmo tirando os “exageros das redes sociais”, são muito grandes: “Há até uma greve marcada para dia 1º, e isso é inédito. Essas coisas todas estão me preocupando e podem afetar a qualidade dos resultados da pesquisa. Espero que não”.
Olinto chama ainda a atenção para o grande número de reclamações dos recenseadores sobre o fraco treinamento recebido, de poucos dias. “No passado, os treinamentos eram muito mais extensos e não apenas para poder operar a maquininha, mas para saber como lidar com situações de assédio, violência e questões do tipo. Isso é parte do treinamento e não se faz em cinco dias”, aponta.