O Conselho Nacional de Educação (CNE) admitiu ampliar o debate sobre as novas diretrizes curriculares nacionais (DCNs) da Geografia, após entidades de geógrafos denunciarem “processo antidemocrático e autoritário” na atual revisão. O tema foi discutido em audiência pública da comissão, na semana passada, e um seminário nacional para avaliar teoria e método, antes de eventuais mudanças, foi proposto pelo presidente da Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, deputado Pedro Uczai (PT-SC).
“É para discutir teoria e método e fazer o debate da necessidade ou não de revisão. E, se houver necessidade de revisão, o que seria revisado nas diretrizes curriculares”, afirmou Uczai, sugerindo que o seminário ocorra na segunda quinzena de novembro para buscar um diagnóstico da geografia no Brasil.
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A revisão do currículo de geografia no CNE começou em 2020, em resposta a inquérito civil do Ministério Público de Minas Gerais. Novas diretrizes chegaram a ser elaboradas e submetidas a consulta pública. Mas, segundo carta aberta da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), sem diagnóstico prévio do ensino e “sem a participação de todos os estudantes, profissionais, departamentos, cursos e entidades de geografia”.
O relator do tema no CNE, Joaquim Soares Neto, entende que a revisão é necessária, já que currículo está em vigor desde 2002 e concorda em ampliar o debate antes de decisão definitiva. Ele adianta que já está sinalizando à comissão responsável pelas DCNs e à Câmara de Educação Superior (CES) a necessidade do aprofundamento das discussões, mas ainda “não vê as condições, neste momento, para discussão na CES”.
Tecnólogos
Além das críticas ao processo de revisão sem a plena participação dos estudantes e profissionais, a presidente da Associação dos Geógrafos Brasileiros, Lorena Pereira, reclamou do conteúdo das mudanças. “São propostas que vão mudar não só a questão do ensino da geografia, mas a atuação do profissional geógrafo e do professor de geografia no mercado de trabalho”, disse.
As principais críticas são relativas à carga horária e à formação dos profissionais de geografia, que além do tradicional bacharelado e licenciatura, passariam a contar com o curso superior em tecnologia. Com 36 anos de ensino de geografia, a professora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) Maria Adailza de Albuquerque apontou sobreposição de formação.
“No Brasil, nós temos os IFs (institutos federais) funcionando com cursos de tecnólogos. Eu não entendo a necessidade de inclusão de formação de tecnólogos dentro de um departamento (universitário) de geografia”, disse.
‘Uberização’
Professor da Universidade de São Paulo (USP), Manoel de Souza Neto vê, na atual revisão curricular, uma espécie de “uberização” da Geografia, com precarização profissional e excesso de foco no ensino técnico, “sem olhar crítico dos processos”.
“O documento provoca profundo empobrecimento daquilo que foi um avanço luminoso e fenomenal no campo da geografia, feito por intelectuais da estatura de Milton Santos, que, ao debater a globalização fragmentária, foi capaz de ganhar o Prêmio Vautrin Lud, uma espécie de Prêmio Nobel, em função da produção que a comunidade de geógrafos e geógrafas brasileiros tem conseguido realizar.”
A Associação Nacional de Pós-Graduação em Geografia (Anpege) também apontou reflexos negativos da atual revisão do currículo de Geografia nos 70 cursos de pós-graduação espalhados hoje por todo o País.
Segundo Charlles Antunes, da Faculdade de Formação de Professores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), “as diretrizes curriculares não podem ter características prescritivas”. Ele avaliou que a revisão em análise no Conselho Nacional de Educação está cheia de verbos impositivos que comprometem a autonomia universitária.
Fonte: Agência Câmara de Notícias