Com recursos espaciais, Embrapa Territorial quer manter agro referência mundial

Embrapa Territorial
Gustavo Spadotti, chefe-geral da Embrapa Territorial (imagem: Embrapa)

O novo chefe-geral da Embrapa Territorial quer apostar nas infraestruturas de dados espaciais (IDEs) para que o agro brasileiro siga crescendo e se mantenha como referência mundial. Em entrevista exclusiva para o Geocracia, Gustavo Spadotti, diz que o órgão tem se especializado na estruturação de ambientes para tornar os recursos espaciais (dado espacial, mapeamentos, zoneamentos etc) disponíveis e orientados às três esferas: municipal, estadual e federal.

“A Embrapa Territorial está em constante movimento para tornar disponível e acessível o conhecimento sobre o território brasileiro. O objetivo é que o produtor rural e os demais agentes do agro tenham autonomia e possam articular as melhores condições para que a agricultura brasileira permaneça como um player crescente e referência mundial”, afirma Spadotti, desde 2015 integrando o braço de geoinformação da Embrapa, onde atuou em projetos de Macrologística Agropecuária, Cadastro Ambiental Rural (CAR) e Sistema de Inteligência e Gestão Territorial da Caatinga e Cerrado. Como exemplos desse movimento para que produtores estejam cada vez mais amparados pela visão territorial, ele cita o GeoInfo, o GeoMatopiba, o SITE M-Log são exemplos desse esforço.

Leia a entrevista na íntegra, a seguir.

A geocodificação dos dados do CAR tem sido uma das grandes contribuições da Embrapa Territorial ao Brasil. Como está o avanço na produção destes dados?

O CAR foi instituído pelo Código Florestal como um registro eletrônico obrigatório para todos os imóveis rurais. Milhões de produtores rurais cadastraram seus imóveis rurais com base em imagens de satélite de alta resolução no Sistema de Cadastro Ambiental Rural (SICAR) do Serviço Florestal Brasileiro. Os limites de milhões de imóveis rurais cadastrados e de milhões de polígonos das áreas dedicadas à preservação da vegetação nativa, em formato shapefile, são obtidos anualmente por download do website do Serviço Florestal Brasileiro e objeto de diversos ajustes e análises pela equipe da Embrapa Territorial.

Desde 2016, a equipe da Embrapa Territorial desenvolveu métodos e procedimentos baseados em geoprocessamento para tratar esses dados do SICAR. Os resultados obtidos a cada atualização demonstraram o papel único e decisivo do mundo rural brasileiro na preservação ambiental. A atualização constante do mapeamento, da quantificação e da qualificação das áreas destinadas à preservação da vegetação nativa pelo mundo rural traz informações fundamentais para a gestão e a conservação desse grande patrimônio natural em diversas escalas.

Vale lembrar que os imóveis rurais cadastrados no CAR não recobrem a totalidade das unidades agrícolas existentes no mundo rural brasileiro. Para conhecer e quantificar a vegetação nativa mantida nessas unidades agrícolas não cadastradas no CAR, o Censo Agropecuário de 2017 do IBGE revelou-se um relevante complemento de informação.

Durante a atualização de 2021 foram desenvolvidos métodos para incorporar os dados dos estabelecimentos agropecuários nessas análises do CAR, de forma a ampliar a compreensão da dimensão territorial do mundo rural. Em escala nacional, são 2.828.589 km2 de áreas dedicadas à preservação da vegetação nativa no mundo rural. Esse total representa 33,2% do território nacional. Ou seja, o mundo rural preserva um terço do Brasil. O produtor rural brasileiro utiliza, em média, 50,6% de suas terras. O restante, 49,4% da área, é dedicado à preservação ambiental. Os dados mais atualizados dessa pesquisa estão disponíveis aqui.

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Como estão as ações da Embrapa Territorial para o desenvolvimento da infraestrutura de dados da agricultura familiar e das startups voltadas ao agro brasileiro?

A Embrapa Territorial tem apoiado a Secretaria de Agricultura Familiar e Cooperativismo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento no desenvolvimento de soluções para a inteligência e a gestão territorial, especialmente relacionada a um dos grandes instrumentos que provêm o acesso desses agricultores aos créditos financeiros previstos no Plano Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf), as DAPs (Declarações de Aptidão ao Pronaf). A organização, consolidação e espacialização dessas informações permitem uma visualização dos perfis dos produtores familiares em cada município brasileiro, nos estados e Brasil, podendo, dessa forma, apoiar o planejamento estratégico de ações voltadas a determinadas regiões, de acordo com as especificidades encontradas nesse mapeamento.

Acompanhada dessa ação, também atuamos em projetos em nível de Bioma, como no caso do Bioma Amazônia, com uma atuação voltada para a inclusão geodigital de agricultores familiares a partir de indicadores de sustentabilidade e apontamentos sobre as principais deficiências na gestão das propriedades.

E, por fim, em nível municipal, também apoiamos a Prefeitura de Vinhedo na operacionalização do Programa Municipal de Incentivo à Fruticultura (Promif), desenvolvendo ferramentas que permitem aumentar a eficiência na coleta e processamento de dados, além de garantir o sucesso da implementação das melhores práticas sustentáveis pelo conjunto de fruticultores do município.

Existe um enunciado de que o mapa deve ser feito uma vez e usado várias. O Brasil ainda faz o mapa várias vezes e usa uma só. Em outras palavras, ao invés de tratarmos a geoinformação como um setor de infraestrutura de dados espaciais, ainda damos o tratamento de propriedade intelectual. Como a Embrapa Territorial pode contribuir para padronizar o mapeamento do País e o compartilhamento de geoinformação, principalmente para defender nossos produtores de acusações internacionais de supressão de vegetação para produção agrícola?

A Embrapa Territorial está em constante movimento para tornar disponível e acessível o conhecimento sobre o território brasileiro no qual ocorre a agropecuária. O objetivo é que o produtor rural e os demais agentes do agro tenham autonomia e possam articular as melhores condições para que a agricultura brasileira permaneça como um player crescente e referência mundial.

Para isso, tem criado e se especializado na estruturação de ambientes para tornar os recursos espaciais (dado espacial, mapeamentos, zoneamentos etc) disponíveis e orientados às três esferas: municipal, estadual e federal. Conhece protocolos, diretrizes, tecnologias da informação e as melhores práticas para efetivar esse objetivo. E tem participado e protagonizado movimentos para que os produtores estejam cada vez mais amparados pela visão territorial. O GeoInfo, o GeoMatopiba, o SITE M-Log são exemplos desse esforço.

Está previsto para breve o lançamento da plataforma de sistema de inteligência territorial e estratégico no bioma caatinga. Como funcionará esse sistema e por que ele será importante para os produtores e o país?

O Sistema de Inteligência Territorial Estratégica desenvolvido para o bioma Caatinga é mais uma iniciativa da Embrapa Territorial que busca compreender as características, os desafios e as potencialidades do mundo rural brasileiro, sempre pensando em subsidiar oportunidades de desenvolvimento agropecuário que efetivamente melhorem as condições dos produtores rurais e que permitam ganhos sociais e econômicos a todas as regiões envolvidas. No caso da Caatinga, essa pesquisa buscou retratar, mensurar e mapear a diversidade desse bioma que, embora seja constantemente lembrado devido aos episódios de seca, possui uma vegetação extremamente rica, com características únicas no mundo e uma agropecuária muito diversa, com mais de 70 tipos de produtos historicamente produzidos e que reúne aproximadamente um terço dos produtores rurais do Brasil.

Essa relevância da região e as demandas por uma compreensão dos desafios e das potencialidades em cada local da Caatinga nos levaram a desenvolver essa pesquisa. Em parceria com o Banco do Nordeste, desenvolvemos o Sistema de Inteligência para o bioma que oferece tanto estudos estratégicos de caracterização da agropecuária regional e dos produtores rurais – sob bases sólidas oficiais e métodos científicos – quanto uma plataforma interativa com uma série de informações e indicadores sociais reunidos, permitindo que produtores, agentes do setor produtivo e pesquisadores de diferentes áreas possam realizar suas próprias análises e interpretações. Esperamos que seja um instrumento relevante para orientar as políticas públicas desenvolvidas para a região em todos os níveis e um importante subsídio às estratégias de investimento do setor privado, incluindo os próprios produtores rurais.

Mapas são versões, nunca fatos. Como o agro brasileiro pode trabalhar para ter um mapa oficial cada vez mais preciso e útil para o país?

Mapas são o resultado final de um trabalho árduo. Eles resumem a transformação de dados, muitas vezes dispersos e despadronizados em informação, esta sim fundamental para execução de ações práticas. Para se ter um mapa preciso e útil, se faz necessária a utilização dos melhores dados públicos oficiais e abertos para retirar a subjetividade e a parcialidade do tema. Além disso, deve-se lançar mão dos melhores métodos disponíveis na ciência para sua replicação e aceitação na comunidade política, civil ou acadêmica. Dessa forma, é possível um diagnóstico base para o apoio a formulação de políticas públicas ou privadas focadas no desenvolvimento dos territórios da agropecuária nacional.

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