Edmilson Volpi*
Desde a primeira foto da Terra vista do espaço, tirada em 1946 com um foguete apreendido aos nazistas, levando o engenheiro Clyde Holliday (que projetou a câmera a bordo do foguete) a especular se era possível mapear “toda a área terrestre do globo poderia daquela forma”, que o homem faz o mapeamento do mundo a partir de satélites. Mas essas imagens contam apenas uma história parcial – com duas dimensões. Agora, segundo reportagem do Atlas Obscura, um arqueólogo e um geógrafo levantam a mesma questão feita por Holliday. Seria possível fazer um mapa completo da superfície terrestre como ela realmente é, em três dimensões, sem a interferência vegetal que esconde o terreno?
O LiDAR (Light Detection and Ranging, na sigla em inglês) é uma forma de gerar imagens do terreno usando pulsos de laser a partir de um avião, medindo a elevação do solo abaixo graças ao tempo que os pulsos levam para retornar. Onde o LiDAR realmente brilha – especialmente no mundo da arqueologia – é na sua capacidade de ver através da cobertura de árvores.
Um sistema Lidar envia tantos pulsos de laser que alguns deles inevitavelmente conseguem atravessar a vegetação. Isso permite que o sistema possa mapear a terra abaixo dela, revelando sua topografia, ruínas e outras obras humanas que não são visíveis em imagens de satélite – e, em muitos casos, nem mesmo no chão.
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O Lidar pode revelar cada protuberância e fenda que deixamos para trás – de estruturas únicas a padrões em grande escala que, de outra forma, levariam muitas vidas para se mapear e entender. “No momento, é absolutamente incrível ver os dados em 3D”, diz Chirs Fisher, arqueólogo da Universidade Estadual do Colorado. “Imagino que, daqui a 100 anos, as pessoas usarão esses dados como o Holodeck de Jornada nas Estrelas”.
Fisher e seu colega Steven Leisz dirigem conjuntamente o The Earth Archive, o projeto que está tentando mapear o máximo possível do planeta com lasers de LiDAR. Fisher utilizou a tecnologia para pesquisar o antigo assentamento Purépecha, de Angamuco, no estado de Michocán, no México. No decorrer desse trabalho, viu mudanças causadas pelo homem na paisagem e decidiu ampliar seu escopo. Seu objetivo final agora é criar um arquivo abrangente de varreduras LiDAR, incluindo algumas que já existem e mais outras a serem adicionadas ao longo do tempo, para alimentar um imenso conjunto de dados da superfície da Terra, em três dimensões. Isso terá uma utilidade tremenda no curto prazo para encontrar locais antigos e padrões em grande escala, mas Fisher e Leisz estão pensando no longo prazo. Com essas ferramentas, dizem eles, quando todos os impactos das mudanças climáticas começarem a se instalar, as gerações futuras terão uma compreensão abrangente de como as coisas eram.
O plano, diz ele, é começar pelos patrimônios ecológicos e culturais mais vulneráveis e seguir a partir daí. Por exemplo, Fisher estima que toda a floresta amazônica, território vulnerável a incêndios florestais, poderia ser digitalizada por avião e helicóptero em seis anos, por US$ 15 milhões. O próximo passo pode ser usar alguma tecnologia futura que coloque o LiDAR em órbita e torne a cobertura de grandes áreas mais fácil.
“No momento, não podemos colocar um instrumento LiDAR em órbita que nos dê o tipo de resolução que estamos exigindo”, diz Fisher. “Daqui a dez anos, talvez isso não seja verdade. Mas não podemos esperar 10 anos”.
“O esforço de Chris é exatamente igual ao que temos feito”, diz Jason Stoker, geógrafo do US Geological Survey que tem trabalhado em um mapa dos Estados Unidos, “mas ele tem a complexidade adicional de acordos internacionais e da coleta de dados internacionais”.
O The Earth Archive promete ser um empreendimento grande e caro – provavelmente com obstáculos futuros que a equipe nem consegue ver agora. Mas Fisher é inflexível quanto à sua importância.
“Eu não sei como resolver a crise climática, mas sei o primeiro passo, e este é o registro básico que o The Earth Archive forneceria”, diz ele.
Leia aqui a publicação original e a tradução no Curiosidades Cartográficas.
* Edmilson M. Volpi é engenheiro Cartógrafo e editor da página Curiosidades Cartográficas no Facebook e Instagram