Dois episódios recentes chamaram a atenção para riscos geológicos: Capitólio (MG), quando 10 pessoas morreram após o desabamento de parte do paredão rochoso, e Franco da Rocha (SP), onde 11 pessoas faleceram em decorrência de deslizamentos provocados por fortes chuvas em São Paulo. Seria possível evitar esses acidentes e salvar vidas? A gestão de riscos com geotecnologias diz que sim.
Ferramentas de sensoriamento remoto, vigilância por satélite usando radar e LiDAR e até drones estão sendo cada vez mais usados por instituições públicas e grandes empresas, sobretudo no setor de infraestrutura, para monitorar riscos, inclusive os geológicos, que vão desde detectar vazamentos de água e gás no solo, a perceber a movimentação de terreno e até acompanhar a integridade de grandes estruturas.
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Riscos e ordenamento do território
Falando sobre o acidente de Capitólio, José Gomes Santos, professor auxiliar no Departamento de Geografia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, fez um comparativo com situação de risco geológico semelhante na Ilha da Madeira, em Portugal, e falou da importância do ordenamento do território no estudo dos riscos e desastres. A ideia é “contribuir, por antecipação, para a mitigação dos riscos de desastre como este ou de outros, sublinhando-se a importância que a produção de Cartografia de Riscos pode ter nas estratégias de Early Warning, ou seja, atuar antes que aconteça a desgraça”.
Para Juliano Lázaro, executivo da Hexagon, uma das maiores empresas de soluções geoespaciais, os casos de Capitólio e de Franco da Rocha são bons exemplos do que os métodos de medição por imagem de satélite podem fazer pela mitigação de riscos, pois, “embora o efeito tenha sido abrupto, há um histórico de movimentação lenta. Essa movimentação lenta, milimétrica, às vezes, a gente consegue medir com imagens de satélite”, diz.
Lázaro explica que essas ferramentas são capazes até mesmo de detectar problemas abaixo do solo, como os decorrentes de vazamentos em tubulações: “É muito comum que essas estruturas se rompam e cavem o solo de dentro para fora, e só se percebe quando abre um buraco e cai um carro dentro. Mas, antes disso, o solo dá alguns sinais, pois com essa erosão por baixo, o asfalto começa a afundar”, explica Lázaro, acrescentando que a grande vantagem do satélite é o fato de ele passar muitas vezes pelo mesmo lugar, formando uma sequência de imagens e um histórico da movimentação do solo capaz de detectar diferenças de três milímetros. Esse afundamento emite alertas no sistema de monitoramento, o que permite que equipes possam ser acionadas para verificar o que está acontecento.
“Sistemas precisam conversar”
Sistemas semelhantes são muito utilizados no acompanhamento de barragens para detectar se há riscos de rompimento, como aconteceu em Brumadinho e Mariana, por exemplo. Mas, Lázaro ressalta que essas geotecnologias não adiantam nada se os sistemas de monitoramento de riscos e de fiscalização não interagem, e cita o caso dos sistemas de monitoramento de queimadas como exemplo.
“Quem faz o monitoramento em tempo real das queimadas é o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e o Censipam (Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia), mas quem fiscaliza é o Ibama, e os dois sistemas não conversam”. Segundo ele, o ideal é que as equipes que monitoram os riscos estejam em estreita colaboração com quem faz a fiscalização, porque o acionamento imediato de quem vai agir no terreno é fundamental para que a gestão de riscos seja, de fato, eficiente.
A mesma preocupação tem o advogado e geógrafo Luiz Ugeda, CEO da lawtech Geodireito. “Em uma cidade, as infraestruturas de saneamento, gás canalizado, metrô e outras, como distribuição de energia elétrica e fibra ótica, estão georreferenciadas e cadastradas em mapas de cada companhia. É preciso haver interoperabilidade entre os sistemas, de forma a termos uma única infraestrutura de dados públicos”, destaca..
No caso de acompanhamento de florestas, por exemplo, um setor que usa cada vez mais ferramentas geo para gerir riscos, tecnologias como LiDAR (Light Detection And Ranging), que emprega luz de laser a partir de satélites, conseguem detectar a altura do acúmulo de biomassa sobre o solo em florestas – um fator de alto risco de incêndios.
Junto com ambiental, outros setores que têm usado cada vez mais as geotecnologias para gerenciar riscos são o de infraestrutura, como elétrico, energia, saneamento e transportes. Em alguns casos, além de monitorar riscos de integridade de grandes estruturas, como plataformas de petróleo e torres de linhas de transmissão, equipamentos como drones evitam arriscar a vida dos profissionais que costumavam a se pendurar nas alturas para realizar esse tipo de inspeção.