O Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA) emitiu na última sexta-feira (27) a Portaria nº 2 que, em seu anexo, divulga a lista prévia de produtores que poderão continuar a usar nomes protegidos como indicações geográficas (IGs) europeias, após a entrada em vigor do Acordo Mercosul-União Europeia. O anúncio é resultado de uma consulta pública realizada no início do ano e, agora, esses produtores brasileiros, argentinos e uruguaios precisam provar que já usavam comercialmente nomes de queijos como Fontina, Gorgonzola, Grana, Gruyère/Gruyere, Parmesão, além de bebidas como Genebra e Steinhaeger/Steinhäger.
Segundo o coordenador de Regulação e Propriedade Intelectual da Secretaria de Comércio e Relações Internacionais, João Neto, houve uma negociação com os europeus das regiões das IGs para que o Brasil e demais países do Mercosul pudessem realizar essa consulta. “Tivemos a concordância das IGs originárias e vamos garantir o direito dos usuários brasileiros. Isso vai ter um impacto muito grande para a valorização do produto, pois permitirá que eles continuem utilizando os termos de referência, o que gera um ativo intangível e representa grande diferenciação de mercado”, destacou Neto.
No caso dos nomes Parmesão, Gorgonzola, Steinhaeger/Steinhäger e Genebra, a comprovação de anterioridade considera apenas documentos mencionados, emitidos ou publicados antes de 25 de outubro de 2017. Já para os nomes Fontina, Grana e Gruyere/Gruyère, a documentação deve ser anterior a 25 de outubro de 2012.
Produtores que não estão na lista de usuários prévios não poderão usar esses termos no território nacional, após a entrada em vigor do Acordo Mercosul-União Europeia. Já as empresas que não participaram da consulta pública com envio de documentos ou queiram entrar com recurso poderão recorrer até o dia 15 de junho, mediante envio de documentação comprobatória completa, pelo e-mail cgsr@agro.gov.br. Estabelecimentos como restaurantes, pizzarias, distribuidores e importadores não serão afetadas pela determinação, pois não se encaixam como produtores.
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“Mesmo erro do STF em relação ao Champanhe”
Mas, para o doutor em Direito nas Relações Sociais com especialização em indicação geográfica Sylvio do Amaral Rocha Filho, a decisão consolida o que ele considera um erro: “Como doutrinador, eu sou contra. Atenta contra a boa-fé objetiva você usurpar o nome de uma indicação geográfica onde você não está. O nome é um patrimônio pessoal indivisível e inalienável”.
Autor do livro Indicações Geográficas – A Proteção do Patrimônio Cultural Brasileiro na sua Diversidade, Rocha Filho explica que a indicação geográfica visa a proteger um bem originário de uma determinada região “e que respeita especificações emanadas pelas associações ou assembleias locais sobre a maneira como aquele produto é feito”.
“Estão repetindo o mesmo erro do STF, em 1974, que, por desconhecer o que era indicação geográfica, autorizou o uso do termo Champanhe por produtores brasileiros em ação ajuizada pela Société Anonyme Lanson Pére & Fils e outras entidades francesas”, lembra o advogado, que foi presidente da Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe), acrescentando que usar a denominação de uma indicação geográfica que não é a sua é “querer se aproveitar de um prestígio que aquele nome tem”.
Assinado em 2019, o acordo entre Mercosul e União Europeia poderá criar uma das maiores áreas de livre comércio do mundo, eliminando o imposto de importação de mais de 90% dos bens comercializados entre os países dos dois blocos e integrando um mercado de 780 milhões de habitantes responsável por um quarto do PIB global. Depende, no entanto, da aprovação do Conselho da União Europeia e do Parlamento Europeu.
Pela importância econômica e seus desdobramentos, sobretudo no setor agrícola, o acordo é o mais amplo e complexo até hoje negociado pelo bloco latino-americano, e várias consultas públicas têm sido organizadas pelo MAPA em uma página dedicada a isso.
Fonte: MAPA