Em artigo no LinkedIn, o assessor Técnico na Secretaria Executiva de Projetos Estratégicos da Prefeitura de São Paulo, João Ricardo Ribas de Morais apresenta um estudo elaborado com análise de dados espaciais que avalia o impacto dos restaurantes Bom Prato para pessoas que vivem nas ruas. O trabalho aponta um dos fatores a se levar em consideração na definição dos locais para instalação de moradias populares da PopRua e sua conexão com a rede de serviços públicos.
Leia o artigo abaixo.
Como assessor na Secretaria de Projetos Estratégicos, estou atualmente com a missão de apoiar a reestruturação das políticas para a população em situação de rua da cidade de São Paulo. Como antecipado na imprensa, dentro do pacote de reestruturação está a previsão de moradias populares destinadas à PopRua. Há desafios de várias ordens aqui – prospectar terrenos, estudar uso de parque privado de imóveis etc. – e nesse artigo vou evidenciar um deles: a conexão de moradias populares com a rede de serviços públicos. Especificamente, busquei responder a seguinte pergunta em meu trabalho: a proximidade de um equipamento Bom Prato faz diferença às pessoas em situação de rua? Ótima oportunidade de utilizar técnicas de análise de dados espaciais, campo que escolhi estudar por conta própria desde minhas primeiras ideias de pesquisa no Mestrado.
Para responder essa pergunta, agreguei duas bases de dados. A primeira é o Censo da População em Situação de Rua, de 2019 e que em breve terá atualização. A segunda é a localização dos restaurantes Bom Prato, disponíveis no GeoSampa. Todas bases públicas, não houve uso de nenhuma informação interna da Prefeitura. Para essa agregação, utilizei o software QGIS, disponível gratuitamente a qualquer pessoa.
A técnica utilizada neste exercício é simples e uma das primeiras/mais fáceis a ser aprendida. Primeiramente, o ponto de latitude-longitude dos entrevistados pelo Censo e dos restaurantes Bom Prato são colocados juntos no mapa. Em seguida, estipula-se um raio de influência para cada restaurante (aqui, foi empregado raio de 2km) e, por fim, divide-se a base de PopRua entre as pessoas que estão a até 2km e pessoas a mais de 2km de um Bom Prato. Feito isso, basta comparar entre estes dois grupos o percentual de pessoas que se alimentam no Bom Prato, informação que é disponibilizada no Censo.
O resultado indica que a utilização do Bom Prato pela PopRua dobra se as pessoas estiverem nas proximidades de um restaurante. No grupo de pessoas distantes a mais de 2km do Bom Prato, 11% disseram se alimentar em alguma unidade Bom Prato. Para o grupo que está a até 2km, a utilização do Bom Prato salta para 22%. Se a pessoa está em algum serviço de acolhimento da Prefeitura, a utilização do Bom Prato é ainda maior, de 23%, contra 21% no grupo de pessoas que dormem na rua.
O resultado inspira a tomada de decisão de política pública no sentido de conectar soluções de moradia popular ou acolhimento à rede de serviços públicos existente. Para resultados de segurança alimentar da PopRua, esta importância foi detectada. Ademais, inspira a própria melhoria do serviço, pois fica o questionamento de porquê esse percentual que se alimenta no Bom Prato está abaixo de 30%. É claro que há limitações, pois as bases não são referentes ao mesmo período de tempo e podem estar desatualizadas – a de PopRua certamente está, pois a pandemia acelerou dramaticamente o crescimento deste contingente. Mas são desafios comuns à análise de dados e que não podem desencorajar a abordagem de políticas públicas baseadas em dados e evidências.
João Ricardo Ribas de Morais é assessor Técnico na Secretaria Executiva de Projetos Estratégicos da Prefeitura de São Paulo, economista e Mestre em Políticas Públicas