Em artigo para o jornal Estado de Minas, sábado passado (08), o ex-presidente do IBGE entre julho de 2016 a maio de 2017, Paulo Rabello de Castro, fez duras críticas ao apagão de dados que vive o país e apontou o que chamou de “ignorância estatística” como um dos responsáveis pelos erros das pesquisas eleitorais que temos vindo a assistir nos últimos anos.
“O atraso no Censo é mortal para as sondagens de opinião, como as pesquisas pré-eleitorais. Os encarregados de ‘vender’ tais levantamentos aos bancos e jornais dependem da atualização do retrato estatístico nacional realizado pelo IBGE. Assim montam as “amostras” das suas investigações de opinião, que são como mínimos pedaços da “pele” da população, numa espécie de biópsia do corpo inteiro. Porém, se o conhecimento do corpo completo está defasado, não há como medir com sucesso os tais “intervalos de confiança” desses pedacinhos diminutos que compõem uma sondagem”, diz Paulo Rabello.
Para o economista e também ex-presidente do BNDES, a ciência estatística é um conhecimento especializado que “foge à compreensão de leigos no assunto, incluindo governantes e comunicadores”: “Os meios de comunicação, que têm a curiosidade como promessa profissional, deveriam ser muito mais atentos em inquirir da qualidade e confiabilidade efetivas desses levantamentos, que mais estragos do que informações trazem à população, já bombardeada por notícias distorcidas. Qual a diferença desses levantamentos em relação às fake news? Para alguns, seria apenas uma questão de grau de desinformação. As sondagens pré-eleitorais não vão deixar de existir. Então, resta relatar direito o que elas significam e parar de chutar ‘margens de erro’ com base em curvas estatísticas de fato desconhecidas”.
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Rabello culpa a classe política pelo desinteresse por levantamentos da realidade social do país: “A ignorância estatística está em todo espectro da representação política dos partidos”. Ele afirma que, para muitos governantes, buscar estatísticas é considerado uma “chatice desnecessária, já que eles mesmos nada decidirão em função de dados, mas só de conchavos”. E arremata: “Quem imaginaria um país como o nosso, com sua poderosa realidade agroambiental, não ter um levantamento atualizado nessa área”.
O ex-presidente do IBGE também critica a decisão de atrasar o Censo de 2020 por conta da pandemia, justificando que outros países, como EUA, China e Portugal, realizaram o levantamento censitário cercado de cuidados especiais por conta da covid-19.
Para Rabello, essa “ignorância estatística tem nome e sobrenome e nasce da caneta vazia de políticos que votam bilhões em emendas secretas, mas são incapazes de liberar recursos adequados para se fazer um Censo Brasil como o IBGE sabe fazer – e, reconhecidamente, dos mais baratos do mundo, não chegando a 10% do gasto americano”.
“A hora do pânico com os recentes erros de pesquisas eleitorais está entrelaçada à péssima gestão política das estatísticas brasileiras, motivo de orgulho no passado, e convertidas, hoje, a material de duvidosa confiança. E, nesse pânico, não há inocentes a ressalvar”, afirma Paulo Rabello de Castro.
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