A questão territorial Piauí-Ceará, que se arrasta desde o tempo do Império, pode estar perto do seu fim com o laudo territorial que o Serviço de Cartografia do Exército Brasileiro e o Departamento de Ciência e Tecnologia (DCT) estão realizando na área conhecida como Cerapió e Piocerá. A previsão era que o trabalho terminasse ainda no primeiro trimestre do ano, mas a pandemia da covid-19 atrasou os trabalhos de campo. Depois da conclusão da perícia, o processo será analisado pela ministra Cármen Lúcia e levado ao plenário do Supremo Tribunal Federal, a quem caberá a decisão final.
A possibilidade de um desfecho para a questão que envolve 21 municípios dos dois lados da divisa e cerca de 3.000 km2 depois de quase 150 anos está acirrando os ânimos, sobretudo do lado cearense, já que, em 2014, decisão do STF deu ganho de causa ao Piauí em caso parecido contra o Tocantins. Se o STF der razão ao Piauí novamente, a divisa entre os dois estados avançará para leste e seis municípios cearenses perderão parte de seus territórios (66% de Poranga, 32% de Croatá, 21% de Guaraciaba do Norte, 18% de Carnaubal, 8% de Crateús e 7% de Ipaporanga).
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Entidades das regiões que podem passar a ser piauienses estão se reunindo para colher assinaturas contra a decisão e levá-las ao STF. Entre outras coisas, elas apontam prejuízos como a mudança no regime de fluxo tributário, que passaria a ser interestadual para outras cidades cearenses, além do temor de que as incertezas afastem os investidores da região.
Na Serra da Ibiapaba, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é uma das entidades locais que está se mobilizando contra uma possível vitória do Piauí. Os empresários locais temem que sairão perdendo com a transferência de suas bases para o estado vizinho. Na semana passada, em entrevista à Rádio piauiense Cidade Verde, o presidente da subsecção da OAB de Ibiapaba, Helter Júnior, subiu o tom.
“Temos um imenso respeito e consideração ao estado do Piauí, é um estado irmão, vizinho, esse respeito sempre vai existir, agora nós, enquanto cearenses, também temos orgulho de ser cearenses, amamos nossa terra e vamos defender cada centímetro do nosso território. Não é algo que levamos para o lado pessoal, é uma questão jurídica”, disse Helter Júnior.
O estudo do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece) defende que o julgamento do caso não contemple apenas a componente topográfica, mas leve em conta também elementos como a dimensão cultural e de identidade das populações que vivem no território em questão.
Disputas começaram ainda no Brasil Colônia
A questão territorial Piauí-Ceará se arrasta desde o início do século 18, quando, em 1720, o Mestre de Campo das conquistas do Piauhy, Bernardo Carvalho de Aguiar, conseguiu uma Ordem Régia que mandava “anexar a aldeia da Ibiapaba à jurisdição da capitania do Piauí”. A ordem, no entanto, foi revogada pelo próprio rei quatro anos depois, deixando toda a Serra da Ibiapaba em território cearense.
Em 1874, o Piauí fez a primeira reivindicação do território e, em 1880, D. Pedro II estabeleceu as divisas, mas as disputas territoriais persistem até os dias de hoje. Em 2011, o tema foi parar no STF e só não teve um avanço maior por conta do atraso na perícia do Exército provocado pela covid-19.
Fonte: Cidade Verde