“O celeiro do mundo está em guerra. Estamos nos estágios iniciais de uma crise alimentar contínua que provavelmente afetará todos os países e pessoas na Terra de alguma forma”. Essa é a conclusão do diretor do Programa NASA Harvest, Inbal Becker-Reshef, depois de analisar os dados do programa, que há mais de 10 anos desenvolve técnicas inovadoras baseadas em satélite para monitorar culturas agrícolas por todo o mundo.
Segundo dados do Serviço Agrícola Estrangeiro dos EUA, antes da invasão da Ucrânia por tropas russas, em fevereiro deste ano, o país fornecia 46% das exportações globais de óleo de girassol, 9% das exportações de trigo, 17% da cevada e 12% do milho. Junto com a Rússia, que agora sofre boicotes internacionais, os dois países respondiam por 73% das exportações de óleo de girassol, 33% do trigo e 27% da cevada. Com a guerra, esse fluxo foi significativamente afetado.
Becker-Reshef alerta que, para algumas populações, a crise alimentar pode significar preços mais altos ou itens ausentes no supermercado. Para outros, no entanto, pode haver uma escassez mais grave, gerando uma crise alimentar com graves consequências.
Pela imagem do topo da página, processada pelo NASA Harvest a partir de dados dos satélites Planet Labs e da missão Sentinel-2 da Agência Espacial Europeia, é possível perceber que 22% das terras agrícolas da Ucrânia (28% das culturas de inverno e 18% das culturas de verão) estavam sob domínio russo, em 13 de junho último.
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Além de permitir ver onde os agricultores operavam livremente e onde suas terras estavam sob controle russo, o NASA Harvest mostra a distribuição das colheitas de verão e inverno no país. As de verão, principalmente milho e girassol, acontecem mais no norte e oeste da Ucrânia, comparadas às culturas de inverno.
O grupo interdisciplinar do Harvest coleta e analisa dados ambientais, econômicos e de ciências sociais para melhorar a tomada de decisões relacionadas à agricultura em todo o mundo. Com a guerra na Ucrânia, ferramentas como essa podem desempenhar um papel fundamental antecipando e prevenindo a escassez de alimentos e a fome.
A equipe do programa, que conta com parceiros internacionais da iniciativa GEO Global Agricultural Monitoring (GEOGLAM), mede vários fatores ambientais, como precipitação, umidade do solo e temperatura, para avaliar a saúde das culturas e antecipar os rendimentos no final da temporada.
De acordo com os diversos dados de monitoramento do programa, depois de um início lento na primavera em função do clima seco e o frio, as condições de cultivo têm sido favoráveis e as colheitas na Ucrânia estão se recuperando bem. Tudo aponta para que o país obtenha um rendimento de trigo de inverno de cerca de 4,1 toneladas por hectare. “Isso não é tão alto quanto a safra recorde de trigo em 2021, mas ainda é uma safra considerável, dadas as circunstâncias”, diz Becker-Reshef.
Mas, uma safra saudável no solo não garante que ela será colhida e enviada ao mercado. Sergii Skakun, pesquisador da NASA e da Universidade de Maryland que cresceu na Ucrânia e passou vários anos no Instituto de Pesquisa Espacial daquele país, conta que um bloqueio naval impediu a Ucrânia de exportar mercadorias por navio, interrompendo grande parte da sua capacidade de vender grãos. Desde o início dos confrontos, em 2014, ele estuda como o conflito militar afetou agricultores e terras agrícolas na região de Donbass, no leste da Ucrânia.
Fonte: Sci Tech Daily