Com grande repercussão na última semana, o jurista Dr. José de Arimatéia Barbosa trouxe em “Cadastro Rural ainda é pífio e a Geoinformação negligenciada” reflexões necessárias, cenários e novas possibilidades que as legaltechs podem oferecer para superar obstáculos, como a citada Geocracia, primeira startup do setor legal e de geoinformação, que fortalece os domínios do Direito Territorial e a busca por inovações tecnológicas do setor com segurança.
Nesta segunda parte, José de Arimatéia analisou com exclusividade os diversos Sistemas que compõem o universo das transações imobiliárias, incluindo o Sistema Eletrônico de Registros Públicos (SERP) e o Sistema de Informação Geográfica de Registro de Imóveis (SIG-RI). Isto tudo sem esquecer a necessidade premente de considerar as dificuldades enfrentadas pelas populações rurais, apontando para a urgência de disseminar informações claras sobre direitos e deveres, especialmente em assentamentos e áreas comunitárias.
Quer conhecer mais sobre o “Projeto de Reurb” em Minas Gerais, o “Programa Imóvel Legal” em Itagimirim, Bahia, e até os versos do poeta Paulinho da Viola, que dá nome a esta segunda parte da entrevista? Aproveite a aula a seguir, aprofundando o entendimento sobre as complexidades territoriais nas transações imobiliárias, sempre buscando “inovação, responsabilidade e acesso à Geoinformação”.
Considerando a implementação do Sistema Eletrônico de Registros Públicos (SERP) por meio das Leis n° 13.465/17 e 13.438/22, qual sua análise do papel do georreferenciamento na melhoria da compreensão e acessibilidade dos novos sistemas e legislações para as populações rurais?
Inicialmente é de se afirmar que bem ou mal, a norma que obrigou o proprietário georreferenciar seu imóvel rural, foi a primeira no País a evitar que perpetuassem as aberrações que saltam aos olhos quando se lê, por exemplo, o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI de ocupações de terras públicas na Amazônia. Com a integral implantação do SERP, certamente mais célere e despersonalizados serão os procedimentos das certificações e suas averbações nas respetivas matrículas dos imóveis georreferenciados, já que melhor qualificados hoje estão todos os operadores do sistema, conforme aliás se vê com a criação do SIGEF- Sistema de Gestão Fundiária – Sigef.incra.gov.br.
Todavia, para as populações rurais temos que respeitar a dificuldade deste público em relação à tecnologia, notadamente quanto à compreensão e acessibilidade dos novos sistemas e legislações aplicáveis; embora em muitas regiões e rincões deste vasto continente, com destaque para assentamentos, nas áreas comunitárias das associações, mesmo dotadas de internet, estas não fomentam informações claras sobre os direitos e deveres dos assentados, o que permite no âmbito municipal, uso político dessa ignorância.
O Sistema de Informação Geográfica de Registro de Imóveis (SIG-RI) – o Mapa do Registro de Imóveis do Brasil – desenvolvido pelo Registro de Imóveis do Brasil (RIB/CORI-BR), realmente proporciona a gestão de diferentes tipos de ocupação do solo brasileiro, contribuindo para o processo de regularização fundiária no Brasil?
Assim foi veiculada no CNJ a notícia sobre este projeto: capaz de surpreender as expectativas e, junto com o avanço tecnológico, o Mapa do Registro de Imóveis do Brasil vende 1ª Edição do Prêmio Solo Seguro do CNJ.
“No Mapa é possível identificar a localização bem como limites de reservas indígenas, áreas com embargo ambiental, entre muitas informações impressas em um único mapa, desta forma combate às práticas ilegais”.
Em diversas ocasiões, participei de painéis tratando com o autor do projeto, colega Sérgio Ávila, registrador de imóveis da capital do Rio de Janeiro, e naquelas oportunidades, com a devida vênia, pontuei que o MAPA, não de forma isolada, mas sim aperfeiçoado com outras plataformas, dentre elas a inovadora geocracia/riobranco, mundialmente conhecida, contribui para o processo de regularização fundiária no país, já ele aquele limita-se a obter informações tão somente sobre propriedades georreferenciadas e certificadas pelo SIGEF; e por isso indaga-se: como ficam as outras áreas, assim considerando as posses e/ou ocupações pelos povos originários, estradas municipais, estaduais e federais, sobre as quais não se tem notícia de suas desapropriações e/ou doações?
Imperativo é ainda assinalar sobre os dados cartográficos que não são de responsabilidade do SIGEF e sim das Unidades Federativas; por isso mantidas em nome dos proprietários privados. Estes dados não são disponibilizados pela plataforma MAPA. Portanto , não resta dúvida de que tudo deveria ser iniciado por projetos com base no georreferenciando das coordenadas dos vértices dos limites dos imóveis urbanos de todos os municípios do país, com uma precisão posicional definida à luz da NBR/ ABNT 17.047/2022., c/c a Lei 13.465/17 e Decreto nº 9.310/18, iniciando-se por aqueles com menor grau de complexidade, valendo-se da máxima de que tudo começa e termina nos limites dos municípios, os quais nesta toada deverão estar capacitados para recepcionar os avanços que a tecnologia oferece.
A bem da verdade, ao longo da última década, vários outros projetos foram objeto de debates dentre eles aqueles que nos parece mais alinhados com a realidade brasileira, cuja metodologia foi recepcionada por vários órgãos, dentre eles a Corregedoria Geral de Justiça de Mato Grosso- CGJ/MT e SRFB, lamentavelmente desconsiderados por ocasião do programa SOLO SEGURO, quais sejam os projetos “Conheça o município através do registro de imóveis e o conheça o município através dos mapas”, ambos executados a partir do ano 2016, com apoio do cartógrafo Almir Azevedo nas comarcas de Campo Novo do Parecis e Tangará da Serra–MT, a estes inclui-se o exemplo de projeto modelo oriundo do Estado de Tocantins, o MOSAICO, assim denominado por seu autor, colega Valdiram Cassimiro.
Todos eles, podem ser identificados como sendo embriões do INVENTÁRIO ESTATISTICO DO REGISTRO DE IMÓVEIS – IERI, que há mais de 2 anos submetido ao crivo do CNJ, vem sendo aperfeiçoado por um Grupo de Trabalho, objetivando a edição de provimento a ser aplicado por todos os registradores do Brasil, seguindo similar provimento 08/2021, do TJBA, executado por 22 serventias de registro de imóveis naquele Estado. Merece destacar que esta inovadora ideia surgiu através da criação do LIODS – Laboratório de inovação, inteligência e objetivos de desenvolvimento sustentável, idealizado pela ex Conselheira do CNJ, Dra. Maria Tereza Uille, coordenado pela Juíza auxiliar do CNJ, Liz Rezende e grupo de trabalho por ela escolhido, dentre eles, os colegas: Lucélia, Yuri, Jean, Pedro e por mim, representando o Instituto de Registro de Imóveis do Brasil.
O “Projeto de Reurb” em Minas Gerais e o “Programa Imóvel Legal” em Itagimirim, Bahia, são exemplos de estratégias adotadas para alcançar a regularização de imóveis. Poderia falar um pouco destas experiências para nossos leitores e destacar tais iniciativas na relação com o uso de tecnologias no aprimoramento da segurança nas transações imobiliárias e o ambiente de negócios de terras no Brasil?
“Quando penso no futuro, não esqueço o meu passado”! Inspirado nestes versos do cantante Paulinho da Viola reconhece-se que ambos são projetos com finalidade de facilitação e de um processo mais rápido visando a regularização de imóveis, todavia não se pode olvidar que tudo começou ainda no século passado com o projeto “More Legal”, criado no Rio Grande do Sul sob os auspícios do Desembargador Décio Antonio Erpen e de seu fiel escudeiro Lamana Paiva, copiado por todos os TJ’s do País.
Neste diapasão, tocando em frente do RS para a Bahia, registra-se que o Desembargado Emilio Salomão Resedá, então Corregedor de Justiça do extrajudicial do interior daquela Unidade Federativa no ano de 2019, nos convidou para percorrer juntamente com colegas baianos as mais diversas comarcas, promovendo audiências públicas, a fim de ouvir da população as dificuldades impeditivas na Reurb naquela região. Referidas comarcas eram por ele eleitas a partir de contatos com os chefes dos Poderes Executivo e Legislativo local, apoiadas pelo Juiz da Comarca, Ministério Público, OAB e demais instituições a fins. Ao cabo desta maratona que durou vários meses consolidou-se o programa imóvel legal, culminando com o exemplar modelo de Itagimirim, onde surpreendente foi o resultado regularizando 100% das propriedades da população daquela cidade, premiada conforme se lê através de registros históricos disponibilizados no site: https://www.cnj.jus.br/.
Em relação ao projeto de REURB em Minas Gerais, que possui, segundo a fundação João Pinheiro:1.787 distritos e pelo IBGE 853 municípios, este foi coordenado pela Secretaria de desenvolvimento econômico daquele Estado, e mesmo não contemplando todos eles, dentre eles o distrito onde eu nasci, São Geraldo de Tumiritinga, teve uma abrangência maior, pois foi destinado a atuar principalmente junto as Prefeituras, objetivando qualificar os servidores que atuariam junto a população destinatária. Abraçou a causa o Colégio Registral Mineiro, promovendo diversos cursos e treinamentos, valendo-se de farto material de divulgação produzido com o apoio de diversas instituições públicas e privadas, segundo consta do site https://reurb.corimg.org/.
Do exposto é fácil concluir que o chamamento permanente por parte do Conselho Nacional de Justiça, órgão que maior credibilidade dá ao certame, prosseguindo-se com novas versões do programa solo seguro, com certeza, será gradativamente reduzida a informalidade que atualmente ultrapassa a casa de 60% (sessenta por cento), segundo pesquisas realizado pelo grupo governança de terras, da UNICAMP, integrado pelo autor desta entrevista.
* JOSÉ DE ARIMATÉIA BARBOSA é Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais. Pós-Graduado em Direito Público, Civil, Processual Civil e Direito Notarial e Registral; Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino – Buenos Aires, com estágio pós doutoral em Direito de Propriedade Europeu e Latino-americano, pela Università Degli Studi di Messina – Itália e no programa de pós doutoramento em Direito das Coisas; Direito Notarial e Direito Registral, ministrado pelo CENOR- Centro de Estudos Notariais e Registrais da Faculdade de Direito de Coimbra – Portugal; Vice Presidente Nacional do Instituto de Registradores Imoviliários do Brasil; Oficial de Registro de Imóveis e Títulos e Documentos da Comarca de Campo Novo do Parecis – MT. Ex-presidente da Associação dos Notários e Registradores de Mato Grosso. Membro do Observatório de Direitos Humanos, Bioética e Meio Ambiente junto à Università Degli Studi di Salerno- Itália e Universidad del Museo Social Argentino – Buenos Aires-AR, da qual é membro de seu Comitê Acadêmico; Professor convidado de diversos cursos de integração Jurídica e pós-graduação no Brasil e no exterior, com destaque para os países: Argentina, Espanha e Itália; Orientador de teses de vários Doutorandos e membro dos respectivos Tribunais da UMSA – Universidad Del Museo Social Argentino- em Buenos Aires, e UNICAMP- Universidade de Campinas; Exerceu atividade de Tabelião de Notas, Protestos, Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais e Jurídicas nas Comarcas de Conselheiro Pena – MG, Alvorada e Colorado do Oeste – RO. Advogado e Procurador Geral Adjunto do município de Governador Valadares e presidente da Junta de Recursos Fiscais; Professor de Direito Constitucional na FADIVALE – Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce – Governador Valadares – MG e de Direito Notarial e Registral na UNITAS – União das Faculdades de Tangará da Serra – MT.
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SEGURANÇA NAS TRANSAÇÕES IMOBILIÁRIAS: QUANDO PENSO NO FUTURO, NÃO ESQUEÇO O MEU PASSADO
Entrevista: Abimael Cereda Junior (MtB 91827/SP)
Fotografia e mini-cv: Enviados pelo entrevistado
Edição: Abimael Cereda Junior e Luiz Antonio Mano Ugeda Sanches