Hélio Gouvêa Prado: “Sou favorável à recriação de uma Concar ágil e efetiva”

Hélio Gouvêa Prado, presidente da SBC (imagem: arquivo pessoal)

Para o engenheiro cartógrafo Hélio Gouvêa Prado, presidente da Sociedade Brasileira de Cartografia, Geodésia, Fotogrametria e Sensoriamento Remoto (SBC), é fundamental que haja uma coordenação da cartografia nacional, o que se refletiria em um melhor planejamento e execução da atividade, além de em uma racionalização de contratações e aquisições nos diversos setores da ação pública. Ele, no entanto, acha difícil que uma nova Concar com 25 membros institucionais (como a Comissão estava configurada quando foi extinta em 2019) consiga fazer progressos: “Entendo [isso] como um devaneio pueril”, afirmou Prado em entrevista exclusiva ao Geocracia, na semana em que se comemorou no Dia do Cartógrafo.

A SBC foi fundada em 1958 e teve participação direta na criação da Comissão de Cartografia (COCAR) de 1967 e da Comissão Nacional de Cartografia (Concar) de 1994. Todavia, a Concar foi tecnicamente extinta em 2019 por um decreto “genérico”, sem mencionar expressamente a Comissão. Qual a sua posição sobre a necessidade de termos, ou não, uma nova Concar?

A SBC, é, segundo seu estatuto, uma associação civil, de âmbito nacional, de caráter técnico-científico, destinada ao fomento do estudo e da pesquisa no campo da Cartografia, Geodésia, Fotogrametria e Sensoriamento Remoto. Como associação, suas decisões são tomadas de forma representativa, quer nas reuniões de Diretoria, do Conselho e, por fim, das Assembleias. Ela apoiou a criação da Cocar, assim como recebeu em suas instalações diversas reuniões e eventos da Comissão. Quando da sua extinção, a SBC foi uma das entidades que atuou pela sua recriação, o que se deu em 1994. Não por uma paixão por criar mais um órgão, mas sim pela necessidade de que exista, efetivamente, uma coordenação da cartografia nacional.

Quando foi criada a Cocar (1967), o foi com sete membros. Na sua recriação, como Concar (1994), o foi com 15 membros, em 2000, tendo sido alterada para 17 membros e, em 2008, para 25 membros. Considero fundamental que haja uma coordenação dos trabalhos, o qual se refletirá em um melhor planejamento e execução da atividade cartográfica e em uma racionalização de contratações e aquisições nos diversos setores da ação pública, dentro dos três níveis de administração. Mas, de outra forma, imaginar que um órgão colegiado com 25 membros institucionais consiga fazer progressos, entendo como um devaneio pueril.

Desta forma sou, sim, favorável a que seja recriada uma forma de coordenar, mas que seja ágil e efetiva.

O sucesso do lançamento do Amazonia 1 e as boas perspectivas para a indústria brasileira de satélites podem ser um impulsionador do mapeamento digital do país, que ainda possui várias lacunas, sobretudo em escalas maiores?

O lançamento e início de operação do Amazonia 1 tem um significado especial. Como a própria página do Inpe diz, é a “Consolidação do conhecimento do Brasil no ciclo completo de desenvolvimento de satélites estabilizados em três eixos”, além da capacitação de instituições industriais nas diversas tecnologias de ponta envolvidas.

O termo mapeamento refere-se a um conjunto muito complexo, que envolve diferentes fases de trabalho. Imagens de satélite são um dos insumos necessários, mas não suficientes. Logo, a combinação da geração de imagens orbitais a partir de plataformas aqui concebidas, desenvolvidas e exploradas associada a um trabalho criterioso para o processamento dedicado às diversas aplicações certamente trará esse benefício de impulsionar a eliminação do “vazio cartográfico”, sobretudo nas grandes escalas.

Nesse ponto convém lembrar que a antropização das áreas é que será o definidor das reais necessidades de aumento de precisão absoluta e, consequente, da escala.

Como o desenvolvimento de satélites ou mesmo a proliferação de drones poderia contribuir, p. ex., para o aprimoramento do Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou do Cadastro Territorial Multifinalitário?

O que eu disse em relação ao mapeamento aplica-se aos diferentes tipos de cadastro. São operações complexas com várias fases na sua execução. Os sistemas satelitais, quer de imageamento ou de posicionamento, são insumos para essas operações. Então, quanto melhores forem os insumos, melhores serão os produtos.

Nesse mesmo sentido, vejo a utilização de drones. Pensando em projetos de mapeamento, ou mesmo de cadastro, vejo os drones como complementares, por exemplo, à utilização extensiva de imagens, pensando em pequenas subáreas onde se queira melhorar a precisão, ou mesmo complementar, onde o imageamento porventura tenha falhado. Sempre, obviamente, sob controle técnico de profissional habilitado.

Como o Brasil poderia desenvolver uma política educacional para que possamos incentivar nossos jovens a programar e a interpretar mapas?

Esse, a meu ver, é o principal diferencial da qualidade e o maior desafio para o nosso futuro. O desenvolvimento tecnológico é provocado por uma massa crítica de pesquisadores e profissionais bem preparados. Esse desenvolvimento vai provocar a necessidade de profissionais capazes de interpretar, utilizar e operar os diversos sistemas existentes.

Creio que o aprimoramento do ensino, não só para a formação de pesquisadores e engenheiros (aqui englobados os profissionais de nível superior) mas, e principalmente, pessoal técnico habilitado e treinado nas diversas tarefas que compõem as fases do trabalho, será essencial para a execução dos projetos.

Vejo, então, a implementação de escolas para formação desses técnicos como o nosso principal desafio a vencer para poder fazer frente às necessidades dos trabalhos cartográficos, tão importantes à nossa infraestrutura.

O Sistema de Informação Geográfica (SIG) nasce com a epidemia de cólera de 1854, em Londres. Que lições a covid-19 deixa para a cartografia brasileira?

Além de uma tristeza profunda pelas perdas de vidas, seja diretamente pela enfermidade ou pelas suas consequências, temos que fazer da tragédia um ensinamento.

Assim como no século XIX Sir John Snow utilizou-se das técnicas de análise geográfica disponíveis à época, hoje vemos uma intensa utilização de Sistemas de Informação Geográfica, dando suporte às pesquisas em andamento, respostas às necessidades locais e à análise das ocorrências, georreferenciadas. Esse aproveitamento trouxe e popularizou essa utilização das técnicas.

Dessa forma, cabe a nós, profissionais da área, incentivar e divulgar tais iniciativas, tão úteis nos dias atuais e nos que ainda virão, pois ficou evidente uma maior importância da geo análise para a resolução de problemas cada vez mais complexos.

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