Grilagem de terra: crédito de carbono alimenta nova onda de apropriação ilegal no AM

Larissa Lousrhania, no amazonas1.com.br, aponta que fraudes fundiárias com fins ambientais voltam a ocorrer no estado, agora sob o manto da sustentabilidade. Mais de 300 mil hectares de terras públicas devolutas no estado do Amazonas foram objeto de apropriação indevida por meio de registros forjados, com a finalidade de viabilizar a comercialização de créditos de carbono no mercado voluntário. A denúncia faz parte da série “Grilagem Verde”, do portal AM1, e evidencia como mecanismos tradicionais de fraude documental se aliam a novos instrumentos ambientais para promover a ocupação ilícita de áreas protegidas ou comunitárias.

No município de Novo Aripuanã, a origem da fraude estaria associada ao incêndio ocorrido no cartório local em 1992, que teria comprometido os acervos fundiários. Desde então, grupos interessados na legalização indevida de terras passaram a utilizar o Provimento nº 34/1992 da Corregedoria-Geral de Justiça do Amazonas para simular cadeias dominiais inexistentes. A ausência de fiscalização fundiária rigorosa permitiu o registro de áreas devolutas em nome de empresas ligadas a projetos de manejo florestal e ativos ambientais, sem comprovação de domínio legítimo ou análise técnica.

Em Presidente Figueiredo, situações similares foram documentadas por pesquisadores da Universidade Federal do Amazonas. Uma empresa do setor imobiliário apresentou títulos falsificados para reivindicar terras ocupadas por famílias de pequenos produtores desde a década de 1980. Em outro caso, uma empresa que atua no mercado de carbono tentou impor critérios próprios para permitir a permanência de comunidades tradicionais no Ramal Serra do Sol, utilizando imagens de satélite como base para demarcar áreas supostamente sob sua posse — sem qualquer respaldo jurídico efetivo.

A vulnerabilidade jurídica do mercado voluntário de carbono é apontada como um dos principais fatores de risco. Por não ser regulado por legislação específica, esse mercado permite a negociação de créditos lastreados em imóveis cuja titularidade não está devidamente comprovada. A ausência de segurança jurídica nos registros fundiários torna o sistema suscetível a fraudes, comprometendo tanto os direitos das comunidades quanto a credibilidade dos projetos ambientais ali desenvolvidos.

Especialistas apontam, ainda, a omissão do poder público estadual na fiscalização e validação dos projetos ambientais com base fundiária. Segundo levantamento realizado por acadêmicos envolvidos na investigação dos casos, entre dezenas de propriedades analisadas, apenas uma pequena fração possui documentação legalmente constituída. Ao permitir o registro de títulos falsos em cartório, o Estado confere aparência de legalidade à grilagem, conferindo aos beneficiários maior capacidade econômica e política para expandir suas pretensões sobre áreas públicas. A ausência de governança fundiária e de regulação ambiental robusta compromete a integridade das políticas climáticas e evidencia a urgência de reformas estruturais no sistema de regularização de terras no país.

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