Anistia fundiária: Congresso avança na dispensa de georreferenciamento pelo Incra

Em mais um movimento que favorece a regularização a qualquer custo, a Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que elimina a exigência de georreferenciamento para a regularização fundiária de lotes sob responsabilidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

A proposta, relatada pelo deputado Alexandre Guimarães (MDB-TO), altera a Lei 11.952/09 e propõe que, para terras já demarcadas pelo Incra, a medição precisa dos limites dos imóveis — até então uma exigência para prevenir conflitos — seja substituída por análises remotas genéricas. O projeto também reduz o valor da terra pública a ser paga pelos ocupantes para entre 10% e 20% do Valor da Terra Nua (VTN), com critérios que beneficiam especialmente lotes maiores.

“A regularização da propriedade rural é uma forma de conceder dignidade ao trabalhador”, justificou Guimarães, tentando emoldurar como justiça social o que especialistas já classificam como um perigoso retrocesso técnico e jurídico.

Sem o georreferenciamento obrigatório, abrem-se brechas para sobreposições de lotes, disputas fundiárias e a regularização de ocupações questionáveis, tudo sob o argumento de baratear custos para pequenos agricultores — mas com efeitos que podem beneficiar também quem ocupa grandes áreas de forma irregular.

O texto ainda prevê que a vistoria presencial será obrigatória apenas em situações com infração ambiental declarada, conflito formalizado ou suspeita de fracionamento fraudulento. Nos demais casos, a posse será avaliada por sensoriamento remoto, confiando em imagens de satélite muitas vezes desatualizadas ou imprecisas para diagnosticar situações complexas.

A proposta unifica os Projetos de Lei 102/20 e 1560/23 e ainda precisa passar pelas Comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Se sobreviver às próximas etapas, estará pronta para ser aprovada sem necessidade de votação em plenário — um “fast track” legislativo para uma reforma fundiária silenciosa, porém explosiva.

O movimento da Câmara contrasta com a linha técnica adotada recentemente pelo próprio Incra, que anunciou a integração do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) com a base de dados da Receita Federal. A medida, que passa a valer em junho de 2025, reforça a exigência de precisão cadastral e documental para certificação de imóveis rurais, tornando obrigatória a consistência de dados como CPF, CNPJ, matrícula e município de localização. Em vez de flexibilizar controles, a integração pretende blindar o sistema fundiário contra fraudes e reforçar a segurança jurídica — exatamente o oposto do que caminha o projeto de lei aprovado no Congresso.

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