Dados abertos no Brasil: Entre a ciência e a soberania digital

Thiago Lima Nicodemo, diretor do Arquivo Público do Estado de São Paulo, escreveu na Revista Ciência & Cultura da SBPC que os dados abertos de pesquisa representam uma das principais fronteiras da ciência contemporânea. No artigo, ele afirma que publicar e reutilizar os dados brutos e metadados produzidos em investigações científicas é um imperativo ético, metodológico e político. O reuso estruturado desses dados, segundo Nicodemo, exige critérios claros de coleta, padrões de interoperabilidade e governança institucional — aspectos ainda frágeis no Brasil, apesar dos avanços em universidades como a Unicamp e na criação de redes estaduais de repositórios.

Apesar do crescimento de iniciativas de ciência aberta no país, Nicodemo aponta desafios persistentes. A resistência cultural de pesquisadores, que ainda priorizam o artigo como único produto científico, a precariedade metodológica e a falta de infraestrutura digital sustentável minam a consolidação de uma política nacional robusta. A publicação dos dados depende não apenas de decisões individuais, mas de diretrizes institucionais que diferenciem o objeto pesquisado do dado científico em si — ou seja, os critérios e estruturas que tornam os dados reutilizáveis e verificáveis.

O autor alerta que qualquer pesquisa financiada com recursos públicos deve ter seus dados considerados públicos, em consonância com a Lei de Acesso à Informação. No entanto, ressalvas éticas, como a proteção de dados sensíveis ou restrições por propriedade intelectual, podem justificar acesso limitado. A pandemia de COVID-19, por exemplo, demonstrou que o compartilhamento amplo de dados entre laboratórios foi decisivo para o desenvolvimento acelerado de vacinas — sem comprometer, necessariamente, a segurança ou os direitos dos envolvidos.

Na avaliação de Nicodemo, é urgente que as universidades brasileiras deixem de tratar seus laboratórios e bancos de dados como feudos privados. A mudança de paradigma exigida pela ciência aberta requer uma lógica sistêmica, com comissões de dados, planos de gestão, padrões de metadados e articulação entre instituições. Além disso, defende-se a criação de uma infraestrutura digital nacional e soberana, que reduza a dependência de plataformas estrangeiras e permita o armazenamento e cruzamento de dados em larga escala.

Para além da infraestrutura, o autor insiste que a soberania da ciência brasileira passa também por uma transformação cultural: a valorização do trabalho coletivo e do compartilhamento responsável. Em tempos de inteligência artificial e produção massiva de dados, não basta que a universidade deposite dados em repositórios. Ela deve liderar a reflexão crítica sobre eles, formar pesquisadores conscientes de suas responsabilidades e pressionar por políticas públicas voltadas à soberania digital e científica do país.

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