Uma disputa fundiária sobre a posse de 80% das terras de Jericoacoara, no Ceará, chamou atenção após a empresária Iracema Correia São Tiago reivindicar a propriedade de 7,1 milhões de metros quadrados da vila turística. A empresária apresentou documentos de 1983 que comprovam sua posse sobre a área, o que resultou em um acordo com o governo do estado, concedendo-lhe 49,5 mil metros quadrados de terras desocupadas. A questão surpreendeu moradores e empresários, que desconheciam qualquer vínculo da família com a região, enquanto a situação se agrava com interferências ambientais.
A área de Jericoacoara frequentemente enfrenta questões ambientais significativas. De acordo com Luiz Ugeda, fundador da startup JusMapp, que certifica áreas no Brasil, a região é alvo de 93 interferências em áreas de proteção ambiental, incluindo 6 embargos e 79 autos de infração conduzidas principalmente pelo MMA, IBAMA e ICMBIO.
A Procuradoria-Geral do Estado do Ceará (PGE) analisou os documentos apresentados pela empresária e concluiu que as matrículas, datadas de 1983, eram legítimas. No entanto, para evitar impactos significativos sobre a comunidade e os empresários locais, o estado negociou com a proprietária para que ela renunciasse às áreas já ocupadas por construções e famílias, assegurando que apenas terrenos desocupados fossem cedidos.
Iracema entrou com o pedido de posse em setembro de 2023, apresentando documentos de terrenos adquiridos pelo seu ex-marido, José Maria de Morais Machado. O acordo final foi celebrado em meio à resistência do Conselho Comunitário de Jericoacoara, que questiona o direito da empresária sobre as terras. O governo do Ceará reconheceu a legitimidade dos documentos de Iracema, mas priorizou a preservação das áreas já ocupadas, garantindo a continuidade dos títulos de posse emitidos anteriormente.
O governo estadual conduziu uma diligência em dezembro de 2023 para verificar a situação dos terrenos em disputa, e catalogou as construções presentes. O processo de regularização fundiária promovido pelo Idace ao longo dos anos concedeu títulos de domínio a muitos moradores e empresários, que desenvolveram a vila e transformaram Jericoacoara em um destino turístico internacionalmente reconhecido.
O acordo firmado entre a empresária e o governo do Ceará reconhece a validade da matrícula de Iracema, mas garante que as áreas ocupadas por moradores e estabelecimentos comerciais não serão reivindicadas. Apenas as terras desocupadas, somando 49,5 mil metros quadrados, serão transferidas para a empresária. Além disso, vias e acessos locais foram preservados, de acordo com a PGE.
Apesar do acordo, o Conselho Comunitário de Jericoacoara e os moradores locais expressaram indignação. Lucimar Marques, presidente do conselho, questiona como a empresária pode reivindicar a posse de terras em um lugar que já está consolidado há mais de 40 anos. A comunidade se mobiliza para contestar o acordo judicialmente, alegando que têm direitos sobre as terras e não aceitarão a cessão sem resistência.
Iracema Correia São Tiago, por sua vez, afirmou em nota que sua reivindicação foi feita de maneira legítima e que ela não tinha conhecimento do processo de arrecadação das terras pelo estado em 1997. Ela ressaltou que o acordo com o governo visa manter as moradias e empreendimentos consolidados, sem interferir na rotina da vila.
O acordo, que minimiza os danos à comunidade e preserva áreas já ocupadas, busca evitar conflitos judiciais futuros e garantir a segurança jurídica para moradores e empresários de Jericoacoara. Entretanto, a controvérsia em torno da posse das terras continua, com a comunidade prometendo levar a disputa para os tribunais.
Com informações de UOL, Estadão e JusMapp