Editorial de O Globo da semana passada afirma que o Cadastro Ambiental Rural (CAR), embora tenha representado um avanço ao permitir o registro oficial de propriedades rurais, enfrenta um cenário alarmante de fraudes, especialmente na Amazônia. Criado em 2014, o sistema foi pensado para viabilizar acesso a crédito e licenciamento ambiental, mas tornou-se também uma ferramenta para disfarçar ilegalidades. Segundo levantamento do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), há 139,6 milhões de hectares com sobreposição no CAR, área equivalente a um novo Pará sobreposto ao território nacional.
Casos emblemáticos, como o da fazenda Terra Roxa, no Pará, ilustram as artimanhas de fraudadores. Com tamanho equivalente ao da cidade do Rio de Janeiro, a propriedade acumulava dezenas de registros sobrepostos e apresentou rápida conversão em pastos e estradas, incluindo uma pista de pouso. Embargos e multas de R$ 5 milhões foram aplicados, mas nunca executados. Outro caso, da Fazenda Jatobá, em Altamira, mostrou como dados no CAR foram manipulados para “mover” a fazenda para dentro do Rio Xingu, a 300 quilômetros da localização original, para driblar fiscalização.
O editorial destaca ainda um estudo da organização Center for Climate Crime Analysis (CCCA), que identificou mais de 9 mil imóveis rurais deslocados ou redimensionados no CAR entre 2019 e 2024 para encobrir desmatamento ou sobreposição com áreas protegidas. Fraudes como a redução artificial da área cadastrada ou o deslocamento de polígonos para rios e lagos são recorrentes. Para o engenheiro agrônomo Raimundo Deusdará, ex-presidente do SFB, o CAR não deve ser tratado como vilão, mas como um “raio X” do caos fundiário brasileiro — sua eficácia depende da fiscalização sobre os dados autodeclarados.
O jornal defende que a recente decisão do ministro do STF Flávio Dino, determinando que União e estados da Amazônia Legal elaborem um plano para cancelar registros irregulares no CAR, seja efetivamente implementada. A ação, segundo o editorial, é um passo necessário, mas insuficiente sem um compromisso duradouro com a fiscalização permanente. Os dados já existem, afirma o texto, mas aguardam um esforço coordenado dos estados para transformar as informações em ação concreta no combate à grilagem, ao desmatamento ilegal e aos conflitos fundiários na Amazônia.
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